Polícia apura golpe de falso médico que liga e pede dinheiro para exames no DF
Cobrança é feita por meio de ligação a acompanhante de pacientes internados em hospitais particulares. Unidades de saúde fizeram placas de alerta. Em julho, polícia do Rio identificou quadrilha de presidiários que aplicava o golpe.
A Polícia Civil do Distrito Federal recebeu novas denúncias de um golpe aplicado contra acompanhantes de pacientes internados em hospitais particulares: aproveitando-se do desespero e da fragilidade das famílias, um falso médico da unidade liga e avisa da necessidade de fazer mais exames. Para isso, cobra um depósito ou transferência imediata de cerca de R$ 2,4 mil e alega que o valor será restituído pelo plano de saúde.
O crime vem ocorrendo em Brasília desde 2015, e um primeiro inquérito já foi entregue à Justiça. A polícia não deu detalhes do que as investigações apontaram nem sobre eventual punição a algum suspeito.
Por causa do problema, um hospital no final da Asa Sul espalhou avisos pelos corredores alertando para a situação. A aposentada Vânia Serra se viu no cenário na semana passada. Um falso médico da unidade de saúde, identificado como Eduardo Alencar, ligou para ela dizendo que a mãe dela precisava fazer novos exames.
Registros de ligações recebidas por aposentada de suposto golpista em Brasília (Foto: Reprodução)
"[Ele falou que] Tinham sido identificadas células que poderiam ser cancerígenas. Perguntou se eu era da área de saúde, aí me deu uma explicação bem detalhada sobre células que poderiam se transformar em cancerígenas", lembra.
A mãe dela tem 90 anos e está internada há 20 dias. A idosa deu entrada após um infarto e teve infecção urinária e pneumonia. A primeira ligação do golpista foi para o quarto, onde estava a cuidadora. A funcionária passou então o celular da aposentada.
Banner no Hospital Santa Lúcia, em Brasília, alerta para golpes de cobrança de falsos exames (Foto: Hospital Santa Lúcia/Divulgação)
De acordo com Vânia, o homem conhecia detalhes do prontuário da mãe dela e sabia dizer até mesmo qual era o plano de saúde da paciente. "Ele disse que, por ser fim de semana, iria abrir uma exceção para o caso dela e falou que depois eu poderia reaver esse dinheiro com o plano."
A aposentada deixou o homem acreditar que ela tinha caído no golpe e simulou estar fazendo a transação – primeiro por internet, que teria falhado, depois por terminal bancário. Foram cinco ligações no total. A última foi atendida pelo agente da Polícia Civil que registrou o boletim de ocorrência.
"As pessoas comentam nos corredores do hospital que esse golpe vem sendo praticado há tempos. O acompanhante de um quarto vizinho também foi vítima do golpe. Eu encontrei mais cinco famílias que foram abordadas com a mesma conversa", relata.
Em nota, o Hospital Santa Lúcia disse estar apurando todas as informações para o esclarecimento do ocorrido. "Acrescenta ainda que todos os pacientes e familiares são orientados sobre o processo de cobrança antes da internação na unidade hospitalar."
Criminosos aplicam golpe em familiares de pacientes de hospitais particulares
Casos anteriores
Quatro famílias denunciaram à polícia em julho do ano passado terem sido vítimas de um falso médico que cobrava o pagamento de supostos exames feitos em parentes hospitalizados. A Polícia Civil acreditava que funcionários dos hospitais onde ocorreram casos do golpe poderiam ter fornecido informações dos familiares para facilitar a extorsão.
O hospital Daher, onde a mãe de uma servidora pública que sofreu o golpe foi hospitalizada, espalhou avisos pelos corredores e, no momento da internação, passou a informar pacientes e familiares que nenhum médico ou funcionário tem permissão para entrar em contato pelo telefone.
Na época, o sindicato dos hospitais do Distrito Federal informou acreditar que não havia funcionários colaborando com os criminosos.
O hospital também é responsável?
Em julho deste ano, a polícia do Rio de Janeiro identificou uma quadrilha que aplicava o golpe em pessoas que têm parentes hospitalizados e em estado grave. A escuta policial durou cinco meses, e mostrou que os criminosos agiam em todo o Brasil, com chips de telefone de vários estados.
Presos fingem ser médicos, ligam e pedem dinheiro para exame
As investigações apontaram, porém, que a quadrilha estava num único lugar: são quatro presos de uma cela da Penitenciária Mata Grande, em Rondonópolis, Mato Grosso. Eles fizeram mais de 90 mil ligações. Fora da cadeia, comparsas sacavam o dinheiro nas agências bancárias. O bando faturava até R$ 200 mil por mês com o golpe.
Hospitais têm responsabilidade por golpes, diz direito do consumidor
Órgãos de defesa do consumidor cobram uma responsabilidade dos hospitais pelo vazamento de informações sigilosas sobre os pacientes. O delegado responsável pela investigação disse que a quadrilha conseguia informações em vários setores dos hospitais. Nesta conversa, um deles liga para a copa e convence a funcionária.
Golpista: Oi, minha querida, quem fala contigo é o Dr. Douglas, aqui da UTI. Trabalhando muito como sempre?
Funcionária: Como sempre, né?
Golpista: Bastante né, querida? A vida de todo o profissional aqui, não é mesmo? Pega para mim o mapa com a dieta dos pacientes aqui da UTI, por favor, querida. Primeiro leito, por favor, o nome e a dieta, por gentileza.
Funcionária: Primeiro leito é o Gabriel.
Golpista: Tem o número do atendimento dele aí queridinha, ou não?
Funcionária: Tem sim.
Ela dá o número sem questionar. Soletra nomes e passa registro e protocolo de vários pacientes
Golpista: Próximo paciente?
Funcionária: É o Saulo.
Golpista: UTI, né?
Funcionária: Isso, na UTI.
Golpista: Registro e protocolo?
Funcionária: Protocolo 1873...
Quer ler mais notícias sobre o Distrito Federal? Acesse o G1 DF.
Comentários
Postar um comentário